Uma das boas histórias do folclore político internacional tem Benito Mussolini como protagonista. Indagado se seria difícil governar a Itália, o líder fascista teria respondido:

– É inútil.

E parece que continua a sê-lo.

Mas se é de inutilidades que estamos falando, o que dizer da poesia? Manoel de Barros, o poeta do Pantanal, não mostra ter dúvidas quanto ao tema: “Um homem que estudava formiga e tendia para pedras me disse no último domicílio conhecido/ Só me preocupo com as coisas inúteis”. Ele? Também, assim o diz.

Afinal, se a poesia existe para – também – emocionar, o mundo, cada vez mais pragmático, ensina que o fundamental para sobreviver em meio a tanta concorrência e disputa por espaços é controlar as emoções.

Uma discussão que envolve, em número crescente, educadores, pais e, essencialmente, os utilitaristas. Ainda em 1997, a escritora francesa Viviane Forrester publicou “O horror econômico”, um alerta quanto ao rumo tomado pela humanidade. Ela nos fala de uma sociedade (futura?) em que músicos, poetas, escritores, cineastas, artistas em geral, não teriam mais razão de existir.

Pode parecer um exagero, mas não é. Quase todos os debates sobre Educação, preparação dos jovens para a vida, têm o mercado de trabalho como fim último – ou único. As boas profissões são aquelas que encontram uma demanda imediata na sociedade moderna. Ou seja: viemos à luz para ser mão de obra qualificada e inserida no contexto. Fora disso, pura perda de tempo e de oportunidades.

Para uma melhor formação, descartam-se as inutilidades, coisas que não dão a prata – essencial para o bem-viver. Os fundamentalistas do pragmatismo já defendem, abertamente, a eliminação das chamadas humanidades nos currículos escolares. Elas só haverão de servir para compor um certo verniz em reuniões sociais.

Se apenas nos conduzem ao entendimento da complexidade do todo, se atenuam o vazio de uma existência narcísica e solitária, se só nos tornam mais humanos – no que conquistamos de melhor – que se danem!

Um antagonismo sem sentido e que, a prevalecer, não nos ajuda como espécie dominante e frágil. Se querem ir mais fundo, que tal buscar o fim biológico da presença no planeta de cada um de nós? A replicação dos nossos genes.

Uma vida sem poesia, sem arte, sem a busca da compreensão do que fomos e somos, esta sim, me soa em tudo inútil.

Um adeus ao médico Alfredo Vasco, parceiro do Doze e Dez Notícias
Desembargadora Elisabeth, "a usurpadora"
  • Rosangela Santos

    Justamente,Ricardo. As prioridades para a formação do SER estão, a cada dia, mais… digamos: esvaziadas de HUMANO! E como você sempre diz: “É lamentável.” Bom domingo.

  • Fernando Andrade

    Lembrei Chaplin no Grande Ditador:Máquina é que não somos… Estou pensando se isso poderia chamar vida,sem poesias,sem artes,sem o rebuscar-se…INUTILIDADE COMPLETA!!!!Ainda bem que estamos na VIDA!!!!!!

  • Celso Tavares

    Reduzindo a discussão a uma das minhas “inutilidades”, as repercussões dessa atitude no exercício da Medicina são terríveis, deploráveis…

  • Cassia Galvão

    Dilaceração total. Os cobaias da nova era que não podem ter carater ou personalidade.

  • Luiz Carlos Godoy

    “Uma vida sem poesia, sem arte, sem a busca da compreensão do que fomos e somos, esta sim, me soa em tudo inútil.”

    Penso que o texto acima merece ser lido à luz de um outro texto publicado neste blog no dia 18/03/2012: “O que é do homem” (http://blog.tnh1.ne10.uol.com.br/ricardomota/2012/03/18/o-que-e-do-homem/).

    Assim sendo, ratifico meu comentário ao texto : “O que é do homem”, pois na minha compreensão, a temática de tal texto é a mesma do texto acima, qual seja: a vida.
    Destarte, penso que a arte não é uma inutilidade, pois é do homem. “Razão dá-se a quem tem – caso de Ferreira Gullar:”
    ‘- A arte existe porque a vida não basta.’
    Nessa toada, acredito que a arte (cinema, literatura, música…) tem a “magia” de estimular nossa capacidade de se imaginar vivendo vidas que não são nossas e, assim, aumentando o apetite para nossa própria vida.
    A arte, em todas as suas variantes, nos propicia a experiência de viver. Ainda, considerando que mitologia também é uma arte, parece-me oportuno o pensamento de Joseph Campbell, autor do livro “O Poder do Mito”:
    “Dizem que o que todos procuramos é um sentido para a vida. Não penso que seja assim. Penso que o que estamos procurando é uma experiência de estar vivos, de modo que nossas experiências de vida, no plano puramente físico, tenham ressonância no interior do nosso ser e da nossa realidade mais íntimos, de modo que realmente sintamos o enlevo de estar vivos.”
    Por fim, tenho que a narração do Gonzagão em “volta à casa” é um exemplo de como a arte pode aumentar nosso apetite para saborear a experiência de viver.
    http://www.youtube.com/watch?v=NqbiRa-7Oxs

  • Eduardo Melo

    Ricardo, todo ALAGOANO está de luto,pois o momento de insegurança em nosso estado é grande e temos q modificar esse momento.

  • Pedro da Rocha Oliveira

    O reduzido número de comentários ao maravilhoso post é sintomático. A carapuça serviu em muitas cabeças.

  • sara

    Infelizmente é verdade,o olhar da maioria dos jovens que estudam é vazio e distante,porque estão estudando para o mercado de trabalho,fazendo cursos que não queriam,hoje muitos jovens não escolhem a profissão que sonhava,e sim o que o mercado pede,estão transformando o ser humano em robôs,sem vontade própria!