Como é dura a vida dos poetas! Pois não é que Ferreira Gullar, o mais genial e divertido mau humor do Brasil (mal-humorado burro é insuportável), tem como “verso” mais conhecido um que ele não escreveu? A sua “Garota de Ipanema” foi verbalizada numa palestra para a qual fora convidado. No meio da sua (imagino) aguda intervenção, Gullar soltou a frase: “Eu não quero ter razão, eu quero é ser feliz”. E deu adeus à plateia.

Hoje, ela está impressa em guardanapos de papel espalhados pelos bares, em camisetas, copos, cartazes – infelizmente, nem sempre com a justa citação do autor. O poeta maranhense do mundo, na verdade, estava incomodado com a recente briga que havia tido com a mulher amada. Com rara capacidade argumentativa, o culto Gullar sempre tinha razão, até o momento em que entendeu que isso só lhe trazia infelicidade, afastando-o da sua bem mais jovem paixão.

Mas cumpriu, ali, o destino dos grandes poetas, que Fernando Pessoa, no seu magistral “O guardador de rebanhos”, havia reservado para os que vivem da incomparável arte de domar as palavras: “Da mais alta janela da minha casa/Com um lenço branco digo adeus/ Aos meus versos que partem para a humanidade”.

Aos 80 anos, o homem de cabelos permanentemente desgrenhados e dentes que parecem não caber na boca há de saber que a felicidade não existe. Entenderá, também, que o mais infeliz dos homens será aquele que cerrar todas as portas para impedir a sua efêmera passagem. Uma fresta que seja, por onde (quem sabe?) penetrará uma nesga de luz, valerá por muitos dias sombrios.

Os anos – já que chegamos ao final de mais um – são apenas a soma, que já me parece  sem muito sentido, de uns tantos clarear-escurecer, cada um repetindo a si mesmo e nos querendo saber a novo. A vida se faz no cotidiano, com todos os seus ciclos imprevisíveis, por mais que tenhamos experimentado do que nos parece ser o todo. Sofrem os poetas, como sofremos os homens comuns, esperando – e é indispensável que assim seja – a entrada de um fio luminoso que possa nos impulsionar, com força, adiante.

Talvez não consigamos – como Gullar – definir com a beleza própria, quase exclusiva dos grandes vates, o momento de magia. O que o leva a escrever? “O espanto”, simples assim – para ele, que encontrou uma definição tão curta quanto precisa daquilo que o diferencia da maioria dos mortais.

Que o mestre me perdõe, mas vou ousar: talvez seja, “o espanto”, aquele instante em que a madrugada vira dia – e os nossos olhos não conseguem capturá-lo com exatidão. Quando nos damos conta, aconteceu. Terá sido num átimo de segundo, imperceptível quando passa – e se repete e se repete e se repete -, mas que nos traz a certeza de que algo mudou. O mundo, então, já não é mais o mesmo.

E a vida segue em frente, apesar das sombras.

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  • Ricardo Ramalho

    Acrescento ao seu texto poético outro conceito que não sei a autoria segundo o qual “a felicidade é monótona”, provavelmente se referindo ao cotidiano repetitivo. Em um romance sem muita repercussão William Boyd afirma, através de personagem: “nunca seja feliz demais!”complementando, por acaso, o pensamento anterior de que não devemos nos acomodar com a “felicidade” do dia a dia.

  • fred

    Meu carissimo RICARDO MOTA, esse seu grande escrito sobre FERREIRA GULLAR, me deixa não espantado, mais ciente que o ser humano na sua infinita bondade tem que ser FELIZ, pois a felicidade é a parte que todo ser humano tem que contabilizar em vida, pois quando mim deparo com pessoas materialistas, fico cá comigo mesmo: será que esse ser vai viver feliz, só pensando no que tem. Meu caro carrego comigo uma frase de meu saudaso pai;*meu amigo vá viver sua vida, esqueça de comprar casa para seus filhos, deixem que eles comprem e também comprem seu carro, aproveite a vida, e nada mais*. Um abraço de quem sempre te acompanha nesses conteúdo de poder maior, que é o poder da informação.

  • Estaleiro Já

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  • Celso Tavares

    Está ficando chato repetir, por óbvio, que a crônica é isso e aquilo. Foi um bom presente de Natal. Obrigado

  • CIDINHA MADEIRO

    Belo texto,assim com todos os de sua lavra.Adoro a poesia,a música,a prosa poética que vive e reina em Ricardo Mota.”Quisera ter o dom de captar teu som…aos tolos tanto faz….”,a poesia e alma só importam aos poetas e amantes da poesia. Parabéns!

    Cidinha Madeiro

  • Antonio Mendes de Barros

    Ricardo, estou viajando e resolvi ler o que tinhas postado neste domingo antes de fazer minha caminhada na praia. Parabéns, está, além de intrigante, é claro, inspirador.
    Um abraço.

  • TANIA

    E vida segue em frente, apesar das sombras…. pura verdade! E feliz aquele que consegue ir driblando as nuvens, as vezes tão negras em nossa vida, mas viva o amor, o importante é ser feliz….

  • noélia costa -´fórum permanente de combate ás drogas

    Belo texto,gosto muito do romantismo,sei que a felicidade é algo complicado nos dias de hoje,mais temos a obrigação de tentar ser feliz.Que Deus te proteja sempre,Um Natal de muita Sobriedade.

  • Vivo

    Mota,

    As expectativas com relação ao ano que se inicia são muitas e em âmbito local, algumas mudanças no governo que conseguiu a reeleição são esperadas.

    Espero sinceramente que na área da segurança e saúde se faça algo mais expressivo. Reconheço que mudanças foram efetivadas; organizou-se melhor a área financeira do Estado, mas outras mudanças são urgentes de precisam ser implantadas de forma rápida.

    Os servidores públicos estaduais necessitam realmente de uma melhoria salarial; mas devem reconhecer que se precisa de uma mudança de atitude urgente no quesito servir à população. Não raramente vemos uma prestação de serviços de qualidade duvidável; uma falta de comprometimento imensa por parte da maioria dos funcionários públicos, que importam-se mais com o relógio de ponto, que servir à povo que lhes paga o salário através de impostos altos e pesados.

    A polícia, seja ela militar ou civil, necessita urgentemente de melhores salários e também de um aumento qualitativo e físico em seus efetivos. Não se pode querer dar segurança a 3 milhões de habitantes, sem pagar bem para evitar, inclusive, o desvio de função com os bicos aos finais de semana ou nas horas de folga, sem se falar nos “servicinhos extras” para os políticos.

    O combate à violência passa também por uma política mais agressiva contra os traficantes de drogas. Não se pode esperar resultados palpáveis apenas aguardando que a educação faça o trabalho na base, pois o tráfico trabalha justamente ali, selecionando e recrutando os menores que não são punidos criminalmente, aliciando-os com ganhos que normalmente não terão de maneira regular.

    A expectativa de todo cidadão de bem deste Estado é ter uma sensação de segurança que havia há uns 20/25 anos atrás, quando parávamos nossos carros e deixavamos as janelas abertas; quando nos preocupávamos com nossos filhos, mas não nos agustiávamos, como nas grandes metrópoles. – Hoje se mata por um celular que não vale mais que R$ 15,00 para se comprar uma pedra de crack; hoje chegamos ao patamar mais alto de mortes na zona de 14 a 17 anos de idade, em todo o País.

    Minha expectativa é grande, assim como a minha esperança que será a última a morrer, espero eu, que não através de uma bala perdida.

  • Marcos Parreco

    Mestre,obrigado pelo texto.Maravilhoso.

  • Rosa

    Bela redação, apesar de um tanto pessimista e descrente quanto à existência da felicidade: “…há de saber que a felicidade não existe.”

  • BENEDITO RAMOS

    Com todos os defeitos, sou fã do Ferreira Gullar, sobretudo do que já escreveu sobre arte. Quanto a felicidade gosto desta do Fernando Pessoa: “Ser feliz é deixar de ser vitima dos problemas e se tornar um autor da propia históra. É saber falar de si mesmo. É não ter medo dos proprios sentimentos…”
    Que você Ricado continue em 2011 escrevendo estas pérolas para nos presentear.
    Quem o estima muito

    Benedito Ramos

  • RENATO DOS SANTOS ROCHA

    A força motriz da vida é a incerteza de cada dia que nasce. Ferreira Gular, excêntrico, mas é gostoso ouvi-lo.Ricardo, parabéns pelos seus escritos em 2010……………2011.

  • Ana Lucia O. Omena

    Rico, fantastica a sua fala poetica q ja nos deleita ha ttos anos. Feliz de todos nos q o temos a nos colorir a alma com seus escritos. Q o ano novo lhe traga um amanhecer de novas inspiracoes e sucesso continuo. Nos amamos vc! Bjos. Lucinha

  • J.Monteiro

    Meu caro Ricardo, se nos faltasse a beleza da espera de um novo dia, que sentido faria, vivermos o dia de hoje?E foi assim, que esperamos a chegada de 20l0, e agora que já o estamos avistando pelas costas, vamos sobrevivendo, de espera em espera, vemos a vida passar, os cabelos embranquecendo, (como os seus), e através da janela da vida, olhamos o nosso mundo e ficamos a nos perguntar: Será que fiz tudo que podia ter feito? Será?