O ex-presidente Jânio Quadros tentou, em vida, desmentir uma calúnia que marcou sua biografia e que ficou registrada como verdade histórica no imaginário do povo brasileiro.

A frase atribuída a ele é risível e digna do melhor folclore político nacional: “Fi-lo porque qui-lo”, teria dito o professor de Geografia de tradicionais escolas paulistanas, um especialista em próclises, ênclises e mesóclises. Morreu frustrado e haverá de ser sempre lembrado pela gafe que não cometeu.

Mais uma vez, valeu a versão.

Nesses tempos em que a internet espalha um verniz cultural de pouca ou nenhuma espessura, uma erudição de resultados, menos sorte têm tido autores clássicos, intelectuais e criadores imortais, a quem se atribuem sentenças nunca ditas ou escritas.

Textos longos e pretensamente profundos e/ou poéticos são publicados e difundidos em nome de personagens reconhecidos no mundo cultural. Jorge Luis Borges, um escritor tão pouco lido no Brasil, tem “assinado” algumas das pérolas que circulam na rede – e nada pode fazer quanto a isso. Clarice Lispector? Continua escrevendo, e cada vez melhor: do túmulo, não se ouve o protesto dos justos.

Já não bastasse aquilo que a repetição, de geração em geração, transforma em dito, ainda que não dito. Um exemplo clássico é a frase atribuída a Dostoiésvski em Irmãos Karamázov: “Se Deus não existisse, tudo seria permitido”. Como resumo das brilhantes intervenções de Ivan Karamázov (seu “poema” O Grande Inquisidor é um dos grandes momentos da literatura universal) nos debates sobre moral e religião a sentença se encaixa com perfeição. Mesmo que não esteja escrita no texto de 900 páginas do romanção russo.

O fato é que a posteridade adotou quase como dogma, a ser sempre repetido, a frase que Dostoiévski não cunhou (azar dele?).

Mas, às vezes, ainda é possível desdizer a obra inteira que marcou uma vida. O pai rejeitando o filho de inegável DNA, tornando-o um renegado público ante uma nação perplexa. Foi assim com Fernando Henrique Cardoso, o mais brilhante intelectual a ocupar a presidência da República. Ao ser flagrado em contradições gritantes, na transição entre pedra e telhado, o príncipe da sociologia, que havia se tornado presidente da República, bradou:

– Esqueçam o que eu escrevi.

Teria se saído melhor, com mais dignidade e altivez, tivesse buscado socorro no iconoclasta Apparício Torelly, o Barão de Itararé. O jornalista e humorista, que foi vereador pelo Partido Comunista no Rio de Janeiro após a ditadura Vargas, ao ser cobrado por ter mudado de opinião, não se apertou e sapecou:

“Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar”.

 

Grupo dos Doze na Assembleia pode virar Bloco dos 14
"A sociedade não acredita na Justiça, e a Justiça não acredita na sociedade"
  • JEu

    “Não é triste mudar de idéias, triste é não ter idéias para mudar”… para mim uma verdade… dentre tantas outras verdades ditas por muitas outras personalidades e pessoas comuns… Creio que a vida é um aprendizado sem fim… sempre podemos reconhecer que nossos conhecimentos são sempre muito limitados perante as leis universais… assim, creio que não podemos “cristralizar” o pensamento, pois corremos o risco de sermos “ultrapassados” pelas verdades maiores que vão surgindo… Creio, mesmo, que a verdade imutável no universo é o Ser Criador de tudo e o Seu Amor por tudo o que criou… no tocante ao demais, tudo muda, pois se transforma e evolui… o grande problema do ser humano é “achar” sabe de tudo e que a sua “verdade” é a maior e a melhor do que a “verdade” dos outros… creio ser preciso que aprendamos a lição da humildade que reconhece o direito dos outros de ter suas “verdades”… e isso é intrinsecamente democrático… Bom texto, Ricardo… Bom domingo.

  • Joao TT

    Ricardo um BOM domingo na língua de CAMÕES, patrono do PRÊMIO de Literatura Brasil-PORTUGAL.
    PRÊMIO dedicado a Raduan NASSAR em 2016, autor de ‘apenas’ 3 livros, férteis SEMENTES entre grandes: C Lispector e G Rosa.
    https://pt.wikipedia.org/wiki/Raduan_Nassar
    RADUAN, nascido em Pindorama-SP 1935 no pós-velha REPÚBLICA de Graciliano prefeito de Pd’ÍNDIOS (1927-1930),
    lamenta … “Vivemos TEMPOS SOMBRIOS” [SEXTA 07fev17]
    http://brasil.elpais.com/brasil/2017/02/17/cultura/1487345056_199380.html
    De que adianta a caudalosa OBRA de príncipe oportunista cúmplicidade do ESQUECIMENTO de loas lambe-botas típicas de TUCANOS derrotados de 2002 até 2014 qual ambíguas LARANJAS cuspidas, bagaços canaviados.
    JÁ em ROMANCES, ambíguas licenças POÉTICAS afobadas favorecem troca-troca de PÉS entre mãos beliscantes e mordidelas de ápices CÚSPIDES dentadas marcando a pele e a ALMA na intimidade profunda.
    * VEM, Eu vou pousar a mão no teu QUADRIL – Multiplicar-te os PÉS por muitos MIL
    * AMOR, onde quer que estejamos juntos – Multiplicar-SE-ão assuntos de MÃOS e pés / E desvãos do SER [Os PASSISTAS, Caetano 1997 álbum LIVRO]
    https://www.vagalume.com.br/caetano-veloso/os-passistas.html

  • Fátima

    A dizer: não mudam de ideia os loucos e os tolos. Quanto às versões, as que ficam, infelizmente sempre foi assim: elas nos servem de muleta quando nos faltam bons argumentos.
    Mais uma vez, parabéns.

  • Gerardo

    O Barão sempre será a consciência crítica do povo brasileiro – ou o que restou dela. Lembrá-lo, em suas frases geniais, é um belo convite à inteligência.

  • Joilson Gouveia Bel&Cel RR

    Antes de comentar ao seu sempre procedente, contundente e percuciente satírico texto-crônica dominical, que nos premia a todos, insto-o editar o abaixo transcrito, que bem reflete a praxe desses ditos pensadores-críticos à esquerda, a saber:
    A BALBÚRDIA PREMIADA
    Joilson Gouveia*
    A mais patente, desbragada, ruidosa, fragorosa, presente e ostensiva demonstração singular, ímpar e cabal de uma hipocrisia hipócrita oprobriosa, inescrupulosa e criminosa: objurga, repudia e repele ao doador; mas sequer devolve a premiação ou o “óbolo” indevido ou contrário aos seus “princípios éticos” progressistas! Ou não?
    É, pois, o estardalhaço uma exacerbação característica, típica e própria de intelectuais progressistas (pensadores-críticos) ou da chamada esquerda caviar (gauche caviar), socialista champagne, liberal limusine, radical chic ou socialistas de botequins.
    Uma comicidade!
    Ou, como bem resumiu ainda mais Mark Taiwin: “Barulho não prova nada: uma galinha bota um ovo e cacareja como se tivesse botado um asteroide”. “Mas fazer barulho é com a esquerda caviar mesmo”. Cacarejou sem ciscar, mas sem largar o ‘asteroide’!
    Ao ensejo, urge destacar Roberto Campos, que assim resumiu o fenômeno, a saber:
    • “É divertidíssima a esquizofrenia de nossos artistas e intelectuais de esquerda: admiram o socialismo de Fidel Castro, mas adoram também três coisas que só o capitalismo sabe dar – bons cachês em moeda forte, ausência de censura e consumismo burguês; trata-se de filhos de Marx numa transa adúltera com a Coca-Cola.”
    Ou outras adequadas citações de Nelson Rodrigues, contidas e transcritas in http://gouveiacel.blogspot.com.br/2016/11/ha-risos-e-sorrisos-nem-sempre-hilarios.html – “é fácil amar a humanidade; difícil é amar o próximo”.
    Enfim, houvesse a mais mínima indignação, aversão, repulsa, constrangimento ou contrariedade ao laurel, mormente ao outorgante, “presidente-em-exercício” (que também é esquerdista tal e qual o laureado) no ensejo representado pelo não menos socialista Ministro da Cultura Roberto Freire, o objurgatório censor constrito deveria abster-se da generosa comenda, abdicar e renunciar ou devolver seu galardão! Ou não? Parece somente ter cacarejado sem largar o ovo!
    Abr
    *JG
    P.S.: Tal e qual aquela legião de artistas, atores e atrizes ou “intelectuais inteligentes” beneficiados pela indigitada lei Rouanet!

  • Joilson Gouveia Bel&Cel RR

    A DESDITA MALDITA DE UMA “ESQUERDA CAVIAR”!
    Joilson Gouveia*
    Desdizer, negar, omitir, mentir, lograr, enganar, dissimular, ludibriar ou imputar e culpar aos outros de tudo aquilo que praticam, fazem e que, realmente, são é mais que uma praxe dogmática habitual, usual, permanente, perene e constante da esquerda e, sobretudo, de seus esquerdistas, bem por isso transcrevo abaixo alguns trechos da obra de Rodrigo Constantino, que tão bem define, demonstra, constata e disseca a “Esquerda Caviar”, a saber:
    • “A esquerda é mestre na arte de pregar uma coisa publicamente e fazer o oposto na esfera privada. Talvez o melhor exemplo seja a postura em relação às escolas públicas, sempre defendidas com fervor ideológico, em detrimento da receita liberal dos vouchers, postuladas por Milton Friedman e que permitiria o acesso dos amis pobres às melhores escolas privadas.
    • Mas os típicos esquerdistas não querem saber dessa escolas públicas na prática. Al Gore, Bill Clinton e, sim, até Barack Obama são exemplos de esquerdistas que não pensaram duas vezes: enviaram seus filhos para caras instituições privadas de elite.
    • O mesmo vale na hora de cuidar da saúde. Hospital Público? Nem pensar! Essa nata da esquerda não coloca seus pés delicados em um hospital público nem que a vaca tussa. Eles se tratam nos melhores e mais caros hospitais privados, e logo depois pregam as maravilhas do Obamacare, da saúde universal, do SUS, que os pobres precisam enfrentar em um calvário pela sobrevivência.
    • A elite petista, aqui no Brasil, é clientela VIP do Sírio-Libanês ou do Albert Einstein em São Paulo, os melhores e mais caros hospitais privados do país. Mas o discurso não muda: a esquerda monopoliza as boas intenções para com os pobres, pois prega a solução estatal…sempre para os outros! (…)
    • Para preservar as aparências, apelam constantemente para o uso de “um peso, duas medidas”. Basta se dizer esquerda para ganhar uma espécie de salvo-conduto para cair em contradições e ficar isento do mesmo critério com que os outros são julgados. Pertencer à esquerda é suficiente para ficar blindado contra as críticas: como ousa questionar minhas lindas intenções.
    • Típico da esquerda caviar é ter memória seletiva, não recordar das bandeiras e dos ídolos defendidos no passado que se mostraram terríveis com o tempo. A autocrítica é algo simplesmente raríssimo quando se trata dessa turma. “Esqueçam o que eu disse” costuma ser o mantra da esquerda caviar, para poder pular de galho podre em galho podre como se nada tivesse acontecido. (…)
    • No Brasil, o fenômeno da esquerda limusine foi agravado durante o regime militar, que criou os “filhotes da ditadura”. Qualquer um que tenha sido contra a ditadura, vista como de “direita”, com o tempo ganhou estima de grande defensor da liberdade e da democracia. Nada mais falso! Boa parte da esquerda lutava para implantar outra ditadura, como aquela existente em Cuba até hoje.” Sic. Sem grifos no original.
    Aliás, “desdizer o dito” (e até escrito), como no caso em comento do “príncipe de Sorbonne”, que vociferou seu brado: “as esquerdas são burras”, no Brasil, que a outra face da mesma moeda esquerdista o imputa ser de “direita” num ardiloso engodo dissimulado, para escamotear a “estratégia da tesoura”, cujo ponto de apoio central tem sido o PMDB, ludibriando aos ignaros, ignotos e néscios medianos medíocres subliteratos “dessepaiz”, os quais até podem ter a coragem de seguir ao dito atribuído ao “Barão de Itararé:
    “(…), com mais dignidade e altivez, tivesse buscado socorro no iconoclasta Apparício Torelly, o Barão de Itararé. O jornalista e humorista, que foi vereador pelo Partido Comunista no Rio de Janeiro após a ditadura Vargas, ao ser cobrado por ter mudado de opinião, não se apertou e sapecou: “Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar”. Sic.
    De fato, triste não é, mas também não é nenhuma “dignidade e altivez” em se tratando de ideias, mas mera, simples e pura hipocrisia, falso, loquaz e mendaz, tal e qual o laureado escritor-censor o fez na sua premiação: http://gouveiacel.blogspot.com.br/2017/02/a-balburdia-premiada.html, fazer diferente do que diz, prega, defende e pensa: “faça o que eu digo e não o que eu faço”! Ou não? No mínimo, também, contrapõe-se aos seus ideais, idiossincrasias, ideologias, premissas e princípios, sobretudo nos campos Éticos e/ou Morais.
    Enfim, bem por isso dizemos, dissemos, editamos, repetimos e reiteramos: urge endireitar, outra vez, de novo e para sempre, o nosso espoliado, aviltado, achacado país!
    A redemocratização debacle foi apenas um joguete enganador ardiloso!
    Abr
    *JG