Seu Luiz Mota não perderia por nada uma final de campeonato alagoano envolvendo o nosso querido CRB, principalmente se o adversário fosse o maior rival – o CSA, está claro. Mas aquela decisão de 1968 não passou pelo crivo do meu pai. Ele disse que a partida estava “arrumada”, e devia ter lá as suas razões para não ir ao campo da Pajuçara. Eu fui com o meu padrinho, Antônio Rocha, o Totonho, uma figura querida por todos nós lá de casa. O Azulão do Mutange ganhou o jogo e sagrou-se campeão, título que veio com um pênalti aos quarenta e alguns minutos do segundo tempo.

Agora eu estava ali, frente a frente com o homem a quem seu Mota atribuíra a tal “arrumação”. Era o ano de 1983, e eu havia ido a São Paulo participar de um congresso sindical – em Praia Grande, litoral paulista. Aproveitei e fui conhecer Santos, juntamente com um amigo que hoje mora em Brasília. Lécio Morais não gostava (e não gosta) de futebol, mas foi minha testemunha naquela conversa quase que surreal com o coronel Nilo Floriano Peixoto. Ele chegara à nossa mesa, num barzinho, depois que o garçom indagou se poderíamos receber uma pessoa que gostava muito de Alagoas (e que estava ouvindo, discretamente, a nossa conversa).

Após assentirmos, o cidadão, já bastante marcado pelo tempo, aproximou-se e se apresentou: “Sou o coronel Nilo Floriano Peixoto. Vocês já ouviram falar de mim?”. Respondi de imediato que sim, e prontamente a conversa escorreu macia. Bem-humorado, o militar da reserva riu quando soube que eu era regatiano. Falou de suas glórias e conquistas no futebol alagoano e, sem titubear um só momento, respondeu ao longo questionário que eu passei a aplicar.

Comecei com o campeonato de 1968. Perguntei sobre a final e as circunstâncias em que ela ocorreu. O coronel Nilo contou que às vésperas da partida havia visitado um zagueiro do CRB cujo pai estava bem doente. Prometeu-lhe toda a ajuda necessária para o tratamento do familiar querido do jogador. Sim, fora ele quem fizera aquele pênalti que garantira o título ao nosso adversário. Confessou e riu desbragadamente.

Já havia feito outras armações no futebol alagoano, antecipou-se. Em 1965 – quando eu ainda não acompanhava com ardor o futebol da terrinha -, havia sido o goleiro do CRB que resolvera ajudar o arqui-inimigo, depois de “uma boa conversa”. Histórias que ele contava com a indisfarçada satisfação de quem havia cumprido o seu dever de comandante da esquadra azul.

Por iniciativa própria, narrou a rasteira que dera na direção do Regatas quando esta resolveu repatriar o atacante Duda, que já fora atleta do CSA. Ele vinha de Recife para Maceió fechar contrato com o Galo, mas o ônibus em que viajava foi parado no meio da estrada pelo coronel Nilo. O “dono” do CSA pediu que o atacante descesse do veículo e o acompanhasse de carro até a capital alagoana, onde um parente dele, bastante adoentado, aguardava ansiosamente. Nada disso! O dirigente do Azulão convenceu-o a retornar ao Mutange. Falava e ria, o coronel, como quem estivesse contando uma peraltice de menino.

“Meu professor no futebol foi Osvaldo Gomes de Barros” (o Vavá), presidente do CRB por tantas vezes. “E o Biano?”, eu quis saber. “Não, esse não aprontava com ninguém”, respondeu. Recebi com certa alegria a última confissão do coronel Nilo. Severiano Gomes Filho, o Biano (da tradicional Casa Fox) havia sido meu vizinho durante a minha infância e adolescência, e era essa imagem que eu guardei dele para sempre: a de um homem austero, cordial e íntegro – além de apaixonado pelo seu time, o nosso time.

Aquela conversa descontraída deixou suas marcas, porém. Quando retornei da viagem, contei ao meu pai como havia sido aquele inesperado encontro, e ele pôde, enfim, confirmar que estava certo quando decidiu não ir à final de 1968. O pior viria depois: nunca mais fui a um estádio de futebol aqui em Alagoas.

Entre os tantos defeitos dos quais não consegui me livrar – e outros até que se agregaram depois -, fui preservado do rancor, dos ódios eternos. Mas o menino não perdoou a morte da sua fantasia.

 

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  • Fernando Mathias

    Triste realidade, caro Ricardo. E de lá pra cá as coisas só pioraram no futebol de Alagoas, com dirigentes que têm como única missão embolsar dinheiro e enganar os torcedores do próprio clube que eles dirigem.

  • Fernando Dacal Reis

    Ricardo, Naquele tempo o que acontecia nos bastidores visavam as conquistas dos CLUBES, hoje as safadezas ocorrem visando conquistas PESSOAIS, o que está nos levando, não a morte de nossas fantasias, e sim do futebol alagoano.

  • carlos

    imaginem esses títulos conquistados da pelo csa, quando o euclides melo, foi presidente.

  • ricardo viera de castro

    ô Ricardo li seu artigo e posso lhe dizer: a corrupção já vem do começo dos tempos e não tem mais jeito, só com uma retomada dos militares para amenizar, para “amenizar”.

  • Giuseppe Gomes

    O Cel. Nilo, réu confesso das suas peraltices, as fez motivado por uma paixão imorredoura pelo nosso azulão. O Galo também teve os “seus” Nilos, e é assim o amor que alguns devotam aos seus clubes, “justificando” os seus atos. Parabéns Ricardo, por nos levar a uma época sem volta.

  • MÁRIO ALBERTO PAIVA

    Acho que a época que houve mais “resultados fabricados” foi na era do São Domingos com os irmãos Spinelli que raptaram até o Martim Francisco treinador do Galo.Um lembrete ao internalta Ricardo V. Castro, O Cel. Nilo era militar. Mário Alberto Paiva

  • josé alexsandro

    O ano de 1999 foi a última vez que isso aconteceu,O Jg FOI CSA X MIGUELENSE,não vimos jogadores,e sim atores,presenciamos a uma comédia.A partir de 2000 o ASA,que tantas vezes foi literalmente violentado,passou a exigir árbitro de fora nos jogos decisivos,taí o resultado.mas,hoje,não presisa.

  • Ricardo

    Ricardo, confesso que sempre acreditei que determinadas armações só ocorria no campo da política, não no de futebol. Ingenuamente, pensei que tais argumentos eram “desculpas esfarrapadas” dos derrotados. Acredite, estou surpreso.

  • Iremar Marinho

    Amigo Ricardo, sou igual ao nosso amigo Lécio Morais, também não gosto de futebol, mas não sou contra quem gosta, claro. Quanto ao seu excelente artigo, também, com as figurinhas que “elegem” para comandar os nossos times, não poderíamos ter coisa melhor,

  • Miguel

    Quando garoto acreditava em cegonha, saci pererê mas hoje, adulto, não me apraz ir a um estádio de futebol assistir “jogos” já com resultados pré estabelecidos. Mesmo sendo torcedor do ASA tenho minhas dúvidas quanto à tantos títulos em tão pouco tempo. Já não sou mais menino.

  • mane

    Piorou mais quando entraram no futebol figuras como: Collor, Valdemar Correia, Euclides Melo,João Lyra,Gustavo Feijó, Wilton Figueroa, olha a relação é enorme… nenhum deles desportistas, caçadores de votos e de $$$$$$$..

  • Marcos Negrão

    Caro Ricardo, Até hoje as coisas são arranjadas no futebol alagoano. Aquela derrota do Miguelense para o CSA por 5 x 0,lá em São Miguel, e o Euclides Mello expulso, gritando que o juiz roubou o CSA. E a desistencia de 6 times para o CSA disputar a série D. Estádios alagoanos, nunca mais.

  • Marcos Mesquita Jr

    Quando do julgamento da errata promovida ao regulamento da segunda divisão o então auditor Armando Portela teve a cara de pau de ao justificar seu voto dizer “…eu me orgulho de neste tribunal ter dado dois títulos ao CRB…” o que faltou ou sobrou foi nos dois clubes.

  • alagoano

    de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra.RuiBarbosa

  • alagoano josé

    É de dar nôjo.”De tanto ver trinunfar as nulidades,de tanto ver prosperar a desonra,de tanto ver crescer a injustica,de tanto agigantarem-se o poder nas mäos dos maus,o homen chega a desanimar da virtude,a rir-se da honra a ter vergonha de ser honesto” Rui Barbosa.

  • EMANUEL

    Caro Ricardo, reminiscências à parte, informe se souber:Em que deu o roubo à farmácia de MACEIÓ,inclusive a ficha do ladrão.Sobre a prestação Contas do nosso dinheiro dado ao CSA pelo bom FORROZEIRO CIÇO.Meu IPTU TÁ EM DIA,e o seu?

  • sergio

    Existe os que ganharam as armações, e os que tentaram e perderam as armações. O que eu quero dizer é que em toda final existe isso. O Flamengo é recordista em resultado comprado. Isso quando não, o proprio juiz teme a torcida e a imprensa Gavião Bueno. E o Valdemar Correia, hein?

  • marcio

    Já pensou senhores leitores se esse cidadão entrase na politica partidária? daria um grande taturana

  • Prá cima “deles” AZULÃO

    Sou azulino, e como eu queria um dirigente como o cel. Nilo Floriano no CSA. Seria a resureição do meu time.

  • ANTONIO CARLOS

    Acredito que a minha grande alegria de ir aos jogos da ASA,é a volta do sonho do menino de jogar pelo seu time,de assistir os jogos com seu pai,com amigos de infância,enfim das lembranças doces do passado, do prazer imenso em comemorar o GOL tão esperando e as gozações aos adversários.

  • Ana Teresa Egypto Floriano Peixoto

    Prezado Sr. Ricardo…
    Leio estarrecida as “peraltices” cometidas por meu pai…
    Sei que o CSA foi sua grande paixão e que inclusive vendeu parte de seu patrimônio p/aplicar no seu time…porém, fiquei surpresa com o seu relato, afinal Papai sempre foi correto e honesto, um exemplo como homem, militar e cidadão brasileiro!!!